Estávamos em pleno PREC, corriamos para uma importante reunião na Casa do Povo do Ladoeiro. Em causa os eternos conflitos de interesses em torno da reforma agrária, que dividia o povo ao meio naquela região Beirã.
No caminho cruzámo-nos com o carro de uns colegas (da Administração) que voltavam em grande velocidade a caminho do hospital de Castelo Branco.
“O que se passou ?” perguntei eu, “uma confusão, está um ambiente de cortar à faca, o Capelo foi agredido e vai para o hospital, não vão lá sem a GNR” foi o que nos disseram.
Mas nós éramos então jovem e, um pouco inconscientes, “não há de ser nada” pensámos.
De facto não foi nada, as pessoas receberam-nos civilizadamente e a reunião decorreu sem mais sobressaltos.
Viemos a saber então o que se tinha passado com o Capelo:
“O homem entrou na Casa do Povo de chapéu na cabeça”, disseram.
Assim foi, Capelo, anacronicamente, usava sempre chapéu e entrou na reunião com o dito na cabeça.
Uns anos atrás, teria sido considerado um capricho do Sr. Engenheiro, afronta que o povo suportaria em silêncio, comentaria em privado e classificaria definitivamente o Sr. Engenheiro Capelo de mal criado, mas naquele tempo não, o povo é quem mais ordenava e não faltaram as vozes de “tira o chapéu”, num coro crescente, a que Capelo, na sua pose altiva de funcionário do Castelo, não obedeceu.
Até que alguém, mais afoito, se chegou a ele e com um gesto brusco lhe fez saltar o chapéu da cabeça. Capelo reagiu violentamente e o povo perdeu a cabeça e desancou o Engenheiro que teve que ser levado, pelos seus colegas presentes, a correr para o hospital.
Para justificar a sua acção, ao contarem-nos esta história disseram-nos:
“A Casa do Povo é como uma Igreja. Se na Igreja um homem de chapéu afronta Deus, na Casa do Povo afronta o povo”
Mesmo nesse momento quente da nossa história recente, quando se vivia uma profunda desagregação de valores, havia comportamentos simbólicos que mantinham o seu papel identificador.
Lembrei-me desta história que vivi, quando vi Bono, com o seu enorme “stetson” na cabeça, a ser condecorado por Jorge Sampaio.
Entristece-me este laxismo, esta falta de vergonha na cara, este achar tudo natural e engraçado, este gozo com símbolos nacionais.
Se a condecoração já foi mais do que duvidosa, naquelas condições foi repelente e creio que desvaloriza toda a “Ordem da Liberdade”, todos os que receberam já e todos os que a irão receber.
Foi um ultraje.
Eu, senti-me afrontado, como Português, e sei que muitos mais sentiram o mesmo, apesar de que na minha volta pelos jornais e pela blogosfera, não tenha detectado uma única referência ao caso.
Lamento que ninguém do protocolo lho tenha tirado, á força se preciso fosse. Era o mínimo.
2005-08-16
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3 comentários:
Perfeito.
que pena que esta opinião não chegue, não só a toda a classe política, como à grande maioria do povo português. Mas se chegasse, será que a compreenderiam?... Penso que é por isso que não há referências ao facto em nenhum outro lado. Haja Deus que alguém ME compreende!
«Quem não quiser ser lobo que não lhe vista a pele»!
Se o sr. PR se desse ao respeito, e mostrasse ser o símbolo da Nação portuguesa, nada disto aconteceria.
Pergunto: - Será que a rainha de Inglaterra, sua alteza real, se daria ao incómodo de proferir um discurso em português - para mostrar uma grande erudição - a alguns dos nossos concidadãos?
E, para terminar, outro provérbio popular: «Quanto mais nos baixamos, mais mostramos o cu»!
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