2005-08-28

Uma interessante questão semântica

A seca que, de tempos a tempos, vivemos em Portugal é muito perniciosa para a agricultura em geral e muitíssimo para a produção pecuária.
Todo os sistema de produção se desorganiza, não há pastos capazes e, se for o caso, têm que se comprar rações e nutrientes específicos que não seriam necessários normalmente e os custos de tudo isto podem ser muito significativos.
Naturalmente os agricultores querem partilhar estes custos com a sociedade, dizem: “não vêem como isto está ? querem continuar a comer borregos e queijo a preços razoáveis, têm que nos ajudar”.
A SIC, como os média em geral, vive num mundo encantado, onde as alegres ovelhas correm e saltam em prados verdejantes e bebericam agua de algum riacho e, estando o tempo de seca, logo as vê lacrimejantes procurando o seu sustento por entre as pedras e percorrendo quilómetros desesperadamente à procura de água perecendo, por vezes, nessa aventura. Morrendo à sede.
Esta forma de ver o mundo convém, naturalmente, aos agricultores que dão assim um toque emocional à defesa das suas carteiras e, de tempos a tempos lá temos imagens dessas ovelhas mortas ... à sede !.
Na realidade, enquanto as modernas máquinas tendem a “animar-se”, como tenho referido nalgumas crónicas, os animais domésticos, pelo contrário, e devido sobretudo a intenso “melhoramento” genético, tendem a “desanimar-se”, são, cada vez mais máquinas de fazer carne, leite e lã, desde que se meta comida, água e medicamentos, por um lado. Nada romântico, mas verdadeiro.
Os animais domésticos só bebem a água que lhes dão, se não lha derem morrem de facto à sede, mas qual o criador que lhes nega agua ? Antes de chegar a uma situação tão dramática, prefere, naturalmente abater o animal e quanto mais não seja, comer um belo ensopado.
Falando neste registo o Sr Ministro da Agricultura profere a frase do escândalo: “nenhum animal morre à sede na nossa lavoura”
A SIC fica estupefacta: “como assim ?, se as coitadinhas nem acham água com esta intensa seca”.
Corre a perguntar aos agricultores, estes, que perceberam bem o que o Sr. Ministro disse, e não lhes convém nada esta descida à terra, tratam de rasgar as vestes, ranger os dentes e alimentar o sonho, e lá vêm imagens de ovelhas mortas num ambiente hostil e o público confirma que o Sr. Ministro é uma besta insensível.
Só que todos os dias morrem ovelhas por causas ditas naturais, acidentes, infecções não detectadas, indigestões, envenenamentos, doenças diversas, isto com seca ou sem seca e assim será enquanto a genética não lhes tirar completamente a vida.
Assim se misturam dois mundos semânticos.
Uns falam em alhos e outros em Bugalhos.

Sem comentários: