2004-11-29

Um dia em Le Mans

Sábado morto, uma longa espera pelo TGV que iniciaria o meu regresso a Portugal.
Acordo cedo de mais, rebolo-me na cama de Hotel procurando posição para passar o tempo, olhando a RTPI.
Saio do hotel e deambulo pelo centro histórico de Le Mans, bem recuperado, sem dúvida, mas muito mais interessante à noite do que de manhã.
Fixo-me num café tomando uma bica (finalmente podemos dizer que a bica já conquistou a Europa, um café, sem mais adjectivos, é já a chávena curta e de espuma densa, a bica, em quase todos os cantos da Europa) e olhando quem passa.
Dizem-me que Le Mans tem pouca imigração mas a maioria dos rostos que vejo, embora ocidentalizados, têm a marca indelével do Magreb.
O tempo passa lento, saio do café prematuramente à procura de um restaurante para um almoço que me faça passar o tempo, paro, bem no centro da cidade, na Brasserie Le Globe, atraído por um item da ementa: "Le Tartare - a vous de préparer".
Entro, sento-me e peço essa pérola da gastronomia da Europa Oriental, que também as têm, com "frites maison". Para beber hesito entre os diferente vinhos da lista, demasiado caros para a qualidade, mas enfim, estava em França, tinha que beber vinho, naturalmente.
O empregado simpático sugere-me um "demi" jarro de Beaujolais (a campanha fabulosa que o Beaujolais está a fazer, pelo menos como vi em na França e na Polónia e de que talvez venha aqui a falar mais tarde, é um excelente exemplo do que muitas das nossas regiões vitícolas poderiam fazer) não o considero de modo nenhum um grande vinho mas enfim, cumpre e está melhor para a bolsa de um português médio.
Chega então o Sr. Tártaro, mal apresentado mas com os ingredientes necessários para se fazer qualquer coisa: a gema de ovo, indispensável, cebolinha, chalota e alcaparras picadas e, à parte, um tabuleiro com o molho inglês, também, para mim, indispensável, várias mostardas, azeite e tabasco, que não usei, sal e pimenta.
Soube-me pela vida, entretanto ouço que o empregado se chama Joaquim, nem mais nem menos, Joaquim, pronunciado exactamente como os nossos Joaquins. Pergunto-lhe a nacionalidade mas diz-me que é Francês, com 3 origens onde Portugal não está, medito sobre esse insólito Joaquim.
Para sobremesa mousse de chocolate e, finalmente, café, Armagnac e cigarros, faltou-me o charuto mas foi, mesmo assim, um belo e repousado momento de nicotina cafeína e álcool.
Mentalmente pensava, tentando adicionar de memória as diferentes parcelas do consumo: vai-me custar uma nota este almoço talvez uns 40 Euros, pensava, mas que se lixe.
Vem enfim a conta: 29 Euros, que maravilha. Pago, olho para o relógio e fico aflito:
Caraças o TGV está quase aí, ala que se faz tarde.

O menino

Na sua incubadora, tentando sobreviver:
- Porra que os meus irmãos mais velhos em vez de sorrirem e me acariciarem só me batem e atiram para o chão.
Irmãos mais velhos
- O raio do puto não para quieto na incubadora e manda-se para o chão a cada passo, por mais que se queira protegê-lo assim não dá, ninguém o segura.

2004-11-27

Porque sou agnóstico

Um ser que obstinadamente pretende que todos os homens o amem a cima de todas as coisas não pode ser Deus, é mais o Santana Lopes.

2004-11-24

Canas de Senhorim

Ainda não percebi bem o que move a população de Canas para entabular esta luta determinada pelo direito a ser Concelho.
Para alguns, poucos, isso servirá os seus interesses, sem dúvida, mas para a maioria o facto não altera um milímetro das suas vidas, a não ser, como uma mera questão de amor próprio e de sentido da sua dignidade e por aí não restam dúvidas, quanto mais oposição houver mais eles lutarão para levar a sua avante.
E não tenho a mínima dúvida de que vão ganhar.
Mas o que custa mais a compreender é quem se opõe a esse reconhecimento.
Inexplicavelmente, as altas sumidades portuguesas repetem de cor, como se fosse verdade, que Portugal tem já muitos Concelhos. Porquê ?
Existirá alguma regra de ouro que imponha essa dimensão ideal ? Haverá algum motivo que seja mais forte do que a vontade da população que os Concelhos servem ?
O que eu vejo em muitos países da Europa, são Comunas que tanto podem ser grandes como pequeníssimas é a dinâmica da população que o determina. E é assim que está bem.

2004-11-21

Polónia

Regressado de Varsóvia, corrigido o erro ortográfico no “até à vista” do título do passado poste, resta-me contar as primeiras impressões desta visita relâmpago à Polónia:
E é mesmo verdade, num ano a Polónia mudou, Varsóvia está com mais carros do que nunca e carros novos, passei por engarrafamentos nunca antes vistos, mesmo tendo em conta que apanhei a primeira neve do ano. O caos era total.
Os pequenos agricultores, que apenas há um ano lideravam a oposição à integração na UE, estão eufóricos com as torneiras de zlotis que jorram de Bruxelas e já não querem outra vida.
A Polónia está a mudar e a mudar rápido.

2004-11-17

Do Widzenia

Novo salto a Varsóvia, por uns dias.Devo voltar já com o orçamento aprovado e a tempo de gozar a prosperidade prometida.

2004-11-15

Referendo

Sampaio disse que é fundamental ratificar o tratado constitucional europeu se não vem o dilúvio.
Cavaco disse que não deveria a haver referendo. Resumidamente, porque o povo não sabe o que quer e é capaz de votar contra só para chatear, pondo em causa uma coisa seríssima que ele não compreende minimamente.
O povo que diga o que eu quero, diz um, ou é melhor que esteja calado, diz outro.
Grandes democratas, digo eu.

2004-11-12

Reflexão sobre a justiça 2

Que a lei tem pouco a ver com a justiça é um facto, para mim, adquirido há muito e se mais razões não houvesse, bastaria verificar que a classificação de um acto como justo ou injusto, não se limita à consideração do acto em si mas a uma infinitude de circunstâncias objectivas, em que ele é praticado, além de condições subjectivas de quem o pratica, motivações, conhecimentos, crenças, atitudes, saúde mental e não sabemos mesmo se o nosso livre arbítrio será tão livre assim ou será antes ouigualmente condicionado por factores inscritos no nosso código genético.
Nenhuma lei pode prever tudo isto, naturalmente, e é por isso que deveriam existir juizes, como homens bons (ou mulheres) e sensatos que mesmo com as suas limitações humanas deveriam analisar os actos concretos, incorporar a informação acessória, deduzir das circunstâncias subjectivas, enfim aproximar um pouco a lei da justiça.
Como exemplo comezinho poderei referir o seguinte:
Existe uma lei, a que felizmente ninguém liga, que me impede de atravessar a rua fora de uma passadeira de peões, se esta existir creio que a menos de 50 metros, todavia se eu visse à minha frente, do outro lado da rua, um cidadão que precisasse da minha ajuda urgente e o trânsito o permitisse, creio que a justiça exigiria e quase ninguém hesitaria um milésimo de segundo entre atravessar imediatamente ou procurar a passagem de peões a 20 ou 30 metros.
A lei tinha sido quebrada mas a justiça tinha sido feita e julgo que qualquer juiz deveria absolver esse alguém sem hesitação, apenas porque sim.
Infelizmente, tendemos, no nosso sistema judicial, para que o juiz não o faça ou que para o fazer tenhamos que recorrer à mentira consentida e estimulada dizendo, por exemplo, que desconhecíamos a existência da passagem de peões ou que pensávamos que estava a mais de 50 metros ou algo no género e felizmente vamos tendo juizes que fingem que acreditam.

2004-11-09

Acho graça

A como alguns pregadores, comentadores bloguistas e jornalistas se afadigam para nos explicar que os EUA são um grande país e nós, que não vamos lá de 15 em 15 dias como eles, não percebemos nada da sua grandeza e complexidade.
Eu, de facto, em toda a minha vida, só estive nos EUA 4 vezes, mas não me deixo intimidar, pela minha suposta ignorância, como disse Lars Van Trier, que já fez pelo menos 2 filmes supostamente passados nos EUA, também eu posso dizer: "Nunca fui aos EUA nem preciso de lá ir para os conhecer bem porque eles entram constantemente pela minha casa dentro, até à exaustão".
Mas mesmo que não tivesse qualquer ideia poderia inferir, que lá, como na Lapónia ou no Cordistão onde nunca estive, os homens devem ser mais ou menos como os de cá que eu conheço, brilhantes uns imbecis outros.
O que difere de facto é o caldo cultural que determina atitudes e comportamentos e aí, para além de ser o aspecto que mais me entra pela casa dentro em todas as suas nuances, é de esperar que num país novo e de imigração diversificada, as diferenças sejam mais do que muitas mas há uma resultante de todas essas forças contraditórias que se traduz nas suas grandes opções políticas, queridas ou consentidas, e aí não restam dúvidas, os homens escolheram mesmo o Bush outra vez.
Isto é um facto objectivo que nenhum analista pode desmentir, sobre o qual eu tenho todo o direito de opinar e opino como o Daily Mirror, também eu digo:
Como é que 55 054 087 pessoas poderam ser tão burras ?
Cá, também aturamos um Santana Lopes mas, pelo menos, podemos dizer orgulhosos que nem um português votou nele, antes assim.

2004-11-08

Pontos Cardeais

A minha visita ao Sulitânia, casa de comes e bebes, e o reconhecimento da importância daquele Sul na Sulitânia, trouxe-me à consciência a minha particular relação emocional com os Pontos Cardeais:
Gosto também do Sul, de todos os Sul, de Portugal e do Mundo; não nutro grandes simpatias pelos Norte, tirando talvez o verdadeiro Norte mais perto do polo e esse país, para mim mítico desde a infância, que dá pelo nome de Canadá. Todavia, talvez o que mais me atraia seja mesmo o NE, todos os NE.
Será que Freud explica isto ?

2004-11-04

Reflexões sobre a justiça

A sentença do julgamento de há dias, da jovem que com 17 anos terá provocado um aborto, tendo sido denunciada à polícia por um enfermeiro, apresenta-se como um caso exemplar.
A juíza decidiu com justiça, mas teve que fazê-lo de forma ínvia, ignorando factos e dispensando testemunhas essenciais para o conhecimento da verdade, porque o seu depoimento iria, certamente, dificultar a justa decisão já tomada.
Ao ouvir as sensatas palavras da Meritíssima, pensei para comigo: não tenho dúvida de que a lei foi quebrada pela jovem mas a justiça foi feita e para que o fosse inteiramente o enfermeiro "bufo", amante da lei, deveria apanhar uma talhada para deixar de ser tão "bom cidadão".
Logo a seguir veio a notícia que eu queria ouvir: a Ordem dos Enfermeiros abriu um processo disciplinar ao "bufo" por ter revelado informações adquiridas no exercício da sua actividade profissional.
Bem feita, digo eu.

2004-11-03

As eleições espectáculo

Bush ganhou, tá bem, se eles acham que sim quem sou eu para duvidar, mas não é das eleições que quero falar mas da sua cobertura noticiosa, se é que há alguma diferença entre as duas coisas.
Assisti ontem à noite, até certo ponto, ao painel de notáveis que comentava as eleições americanas na SIC-notícias..
Ora estava Bush à frente, ora Kerry, entretanto havia o fantasma da Florida que tanto trabalho tinha dado nas anteriores eleições, todos queríamos saber quem ganhava na Florida.
A dada altura um jornalista explica que Bush vai à frente na Florida, por poucos votos mas ainda falta cerca de 1 milhão de votos por correspondência e afins, que só começariam a ser contados na próxima quinta-feira.
Os especialistas, presentes explicam logo, tratando por tu a situação:
- Sim, na Florida é assim mesmo, há muitos votos de soldados que estão no Iraque e mais outros que já votaram antes etc. etc.
Conformei-me, só depois de quinta-feira saberíamos alguma coisa.
Fui para a cama, assim no escuro e quando acordo de manhã, por milagre certamente, a Florida já está toda contada e Bush ganhou. Sobre aquela questão da quinta-feira, que todos os especialistas conheciam tão bem, nem mais uma palavra ou explicação: já está tudo contado e pronto, agora o problema é Ohio, aí sim, ainda falta um montão de votos provisórios e os democratas não desistem enquanto não contarem todos.
No entanto os republicanos estão a pressionar para que Kerry reconheça a derrota, porque se assim fizer fica já o caso arrumado e não é preciso contar mais nada.
Entretanto eram sempre tratado ao mesmo nível, votos reais e previsões à boca das urnas, de todos os dados que vejo e leio não sei se são uma coisa ou outra e suspeito bem que o jornalista que os transmite também não sabe.
Eu penso, para mim: afinal que porra de eleições são estas da "pátria da democracia" que eu não estou a perceber nada ?