2004-01-29

O BESCL

Foi o Adriano quem me chamou a atenção para o óbvio: como, talvez sem crer, o recente anúncio televisivo do BESCL acertou em cheio na música que escolheu.
“Tudo o que te dou, tu me dás a mim ...”
De facto, este pequeno pedaço da letra de Abrunhosa traduz, em poucas palavras, toda a essência da actividade bancária.

2004-01-28

Livros

Hoje, pensei para comigo:
Em vez de fazer estes postes desconchavados, gostaria de escrever 3 livros.
Um primeiro sobre a relação do indivíduo com a máquina judicial, imensa, absurda, como um monstro bio-mecânico que tudo tritura, numa (i)racionalidade implacável e em relação à qual um modesto cidadão, como eu, sente a enormidade da sua impotência.
Tenho este livro na cabeça, chamar-lhe-ia “O Processo”.
Um outro relataria a actividade impotente de cada um de nós, relativamente ao peso de uma, ou melhor, de todas as administrações burocráticas, com a sua (i)lógica própria e toda poderosa.
Também já tenho a ideia, dar-lhe-ia o nome de “O Castelo”.
Um terceiro trataria da precariedade da relação de um homem ou mulher normal com o seu próprio quotidiano e da instabilidade dos modelos em que assenta.
A este, daria o nome de “A Metamorfose”.
Se tivesse o talento necessário, que não tenho, deveriam ser 3 livros magníficos que me poupariam muitos postes.

2004-01-26

Jantávamos

em família, calmamente, conversávamos, entre garfadas, sobre o lúgubre tema da morte ou, mais precisamente, sobre diferentes atitudes do homem face à morte.
Percorríamos diferentes casos de familiares e amigos, casos de lutadores pela vida, casos de outros que parecem desistir de viver, dos que temem a morte, dos que a desejam e de outros que lhe são indiferentes.
Recordámos como a morte nos é apresentada neste universo espectacular, como algo perfeitamente evitável que apenas aparece por desleixo nosso: os cigarros que matam, os exercícios e dietas que não se fazem, a falta de cuidado e vigilância médica, enfim, essa ideia que se generaliza nos subconscientes de que morremos apenas porque queremos, e é bem feita.
Estávamos nesta conversa, na mesa um saboroso cabrito assado, sentindo-nos confortados pelo suave prazer de continuarmos vivos meditando na morte, quando, inesperadamente, violentamente, cruamente, brutalmente, destruindo, num ápice, todas as teorias que formulávamos, a morte, ela própria, em directo e ao vivo, nos chega pela TV. Um breve sorriso de Fehér logo seguido da morte, fulminante.
Apenas o tempo necessário para a sinistra ceifeira, numa gadanhada rápida, roubar uma vida jovem, que não fumava, seria assistida medicamente e teria uma alimentação cuidada.

2004-01-23

Opiniões

Carvalho da Silva, acha que esta greve na Função Pública pode obrigar o Governo a alterar a sua política.
Eu, por acaso, acho que não

2004-01-19

Sinal dos tempos

Vemos diariamente na TV um grupo de miúdos vangloriando-se das proezas dos seus progenitores.
Diz o primeiro
- O meu pai sabe tudo ...
Perguntar-se-ia, porquê ? Porque é cientista, professor catedrático, filósofo, bruxo ?
A resposta a esta questão vem logo, arrastando todo o peso do senso comum:
- Porque é jornalista !

2004-01-18

Quem guarda os nossos guardas

É interessante verificar como se construi a nossa idiossincrasia, o nosso sistema de valores e de crenças que determinam as nossas atitudes sobre todas as questões.
É interessante ver como de forma inconsciente acumulamos pedras nessa construção ou desprezamos outras que parecem não se encaixar bem ou ainda como tentamos, por vezes, a escopro e a martelo, adaptar outras que nos pesam demasiado e, no entanto, permanecem determinando as nossas contradições até que em momentos de lucidez as conseguimos expulsar.
Vem esta introdução a propósito deste pequeno trecho de Aldous Huxley que, como outros, ficou retido no meu imaginário desde que o li pela primeira vez, há quase 30 anos e permanece firme na minha construção:

“Os súbditos do ditador do futuro serão governados sem dor por um corpo de Engenheiros Sociais altamente instruídos. “O desafio lançado pela engenharia social do nosso tempo”, escreve um advogado entusiástico desta nova ciência, “é como o desafio lançado pela engenharia técnica há cinquenta anos. Se a primeira metade do século XX foi a era dos engenheiros técnicos, a segunda metade bem pode ser a era dos engenheiros sociais” – e o século XXI, suponho, será a era dos Administradores do Mundo, do sistema científico das castas e do Admirável Mundo Novo.
À pergunta quis custodiet custodes ? – quem montará guarda em volta dos nossos guardas, quem será o engenheiro desses engenheiros ? – a resposta é uma serena negação de que eles necessitem de qualquer supervisão.
Parece ser uma crença tocante, entre os doutorados em sociologia, a de que os doutorados em sociologia nunca serão corrompidos pelo poder.
Tais como Sir Galahad, a força deles é como a força de dez porque o seu coração é puro – e o coração deles é puro porque são cientistas e tiveram seis mil horas de aulas sobre Ciências Sociais.”
Aldous Huxley – Regresso ao Admirável Mundo Novo

2004-01-15

ONG 2

A posição de Mana Lu sobre as ONG, referida abaixo não é única e fez-me recordar um episódio que vivi há alguns anos no primeiro encontro mundial do desenvolvimento local realizado em Sherbrook, no Canada.
Retive várias vivências marcantes, positivas e negativas, desse encontro, sendo uma das quais, que quero contar agora, o conteúdo do discurso de um dos participantes africanos que disse mais ou menos isto numa lógica inquestionável:
“Consideram-se as ONG como a grande solução para promover o desenvolvimento e a sua presença justifica-se, naturalmente, nos países menos desenvolvidos como o meu país.
Acontece porém que os seu número tem aumentado exponencialmente nos últimos tempos, cada nova para prover o desenvolvimento que as instaladas há mais tempo não conseguiram, mostrando que em lugar do desenvolvimento tem persistido sempre o subdesenvolvimento. Para quê então as ONG ?”
Foi a primeira vez que ouvi criticar o papel destas agências.
Depois, acompanhei no terreno o trabalho de algumas e questionei-me nalguns casos se não se verificava aquele hipócrita fenómeno referido por Mana Lu: “Muitos aproveitaram a pobreza, miséria e destruição total do território apenas para pedir em nosso nome”.
Lembro-me aliás de uma interessante comédia da BBC, centrada numa ONG, onde esta transformação de agências de desenvolvimento em máquinas de auto sustentação era brilhantemente caricaturada.

ONG

A irmã Lurdes fundadora e dirigente de um Instituto Católico de apoio aos mais pobres de Timor, conhecida como Mana Lu, proferiu numa entrevista ao Público do passado dia 11, entre outras, as afirmações que transcrevo:
“MANA LU - Tivemos a estratégia necessária para mandar embora os indonésios, mas não estávamos preparados para a independência. Ficámos muito dependentes, sobretudo depois da presença das ONG [Organizações Não-Governamentais] internacionais. Muitos aproveitaram a pobreza, miséria e destruição total do território apenas para pedir em nosso nome. Agora já regressaram [aos países de origem], mas destruíram a nossa mentalidade de independência, tornando-nos dependentes.”
Sendo as ONG um instrumento moderno, apontado como exemplo da acção da sociedade civil para colmatar as limitações e ineficácia das organizações públicas, não podemos ler esta passagem sem reflectir.
Será que Mana Lu rejeita, por despeito ou inveja a acção destes concorrentes do seu Instituto ? ou será que há alguma verdade no que diz ?
Como é já tarde, apenas amanhã ou dentro de algumas horas, voltarei a este assunto.

2004-01-13

Situação preocupante

Fez-se um concurso de spots publicitários anti Bush e parece até que um milionário americano disse estar disposto a pagar para que Bush não seja reeleito.
Quer dizer: ver e ouvir o que se passa não chega, é preciso fazer desenhos.
Com estes sinais acho que o homem está para ficar.

2004-01-09

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

Contou-me há dias o meu sábio amigo Eng. Gusmão, que tem registos do facto:
No princípio do século XX, uma operação mediática que entusiasmou o país.
Sua Magestade mais meia Corte e vassalos, organizam uma grandiosa expedição ao Norte de Portugal.
Para quê ?
Para a suprema glória de matar a última cabra do Gerês !

2004-01-08

Ouvi hoje

Pela milésima quatrocentésima trigésima sétima vez: “a liberdade de cada um termina onde começa a liberdade dos outros” e, pela milésima quatrocentésima trigésima sétima vez, perguntei a mim próprio: o que será que querem dizer com isto ?.
O contexto em que a ouço, na maioria das vezes, aponta para o cerceamento das mesmas liberdades, nos outros, é claro. Leva ao seguinte raciocínio: a liberdade de todos termina onde começa a minha, gerando justificação para uma prepotência pseudodemocrática.
Quase nunca se lê assim: a minha liberdade termina onde começa a de todos os outros, felizmente, porque gera uma autoanulação insuportável.
Vejamos um exemplo:
Imaginemos que seguem dois carros por uma via única: o da frente segue lentamente travando necessariamente o de trás, que quereria ir mais depressa.
Apliquemos a velha fórmula a esta situação:
A liberdade de ir devagar, que é reconhecida ao da frente, termina onde começa a liberdade do de trás que quer ir mais depressa, logo este deve acelerar.
A liberdade do de trás, de ir mais depressa, termina onde começa a liberdade do da frente de ir mais devagar, logo este deve sujeitar-se ao andamento lento.
Em resumo, a velha fórmula, ainda que aparentemente bonita, não resolve nenhum problema e é absolutamente inútil. Espanta-me como é tão repetida e tão consensualmente aceite.

2004-01-06

Voltei

Há alguns dias que não escrevo, não leio, em resumo, não tenho querido saber de posts e de blogs.
Na realidade não sei por quê, foram as festas, talvez.
Mas hoje, ao voltar à rotina, não é que vejo na Euronews uma notícia digna de ser assinalada:
Uma professora Finlandesa, corria para a sua escola de bicicleta, como sempre mas, nesse dia, um pouco nervosa porque ia encontrar um grupo de estudantes de uma escola austríaca, de visita à sua escola finlandesa, ao abrigo de um Programa Comunitária cujo o nome não retive.
Pensei para comigo: que programa interessante, o intercâmbio de jovens do ensino secundário, fazendo-os viver um pouco da experiência dos seus colegas europeus de uma remota aldeia da Finlândia. Creio que é mesmo assim que se construi a Europa e se cria esse espírito transnacional de tolerância e de pertença a uma nova realidade baseada, não na homogeneidade, mas, precisamente, nas especificidades de diversas diferenças que tornam mais colorido um padrão comum.
Como não conhecia o programa, pensei que talvez poucos o conhecessem cá e que era pena se os portugueses o não o utilizavam.
Engano meu, na mesma notícia, logo a seguir, se precisava que eram alunos austríacos e também uma delegação da escola de Silvares de Portugal, só que desta só vinham professores porque não havia verba para os alunos.
É assim Portugal: num programa de intercâmbio de alunos só há verbas para os professores ....
Apetece-me dizer como o saudoso Peça: E esta, hem ?