2003-09-04

Os mortos do calor

O debate deste tema em Portugal tem assumido laivos surrealistas.

Em França, como sabemos, morreram cerca de 11 000 franceses mais do que o normal, devido ao calor excessivo que assolou aquele país e em geral a Europa e, esse acréscimo causou a falência dos serviços de apoio, hospitais, centros de saúde, e mesmo cemitérios.

O debate que se faz em França não é pois sobre o facto de o calor matar ou não matar franceses mas sim sobre a incapacidade de resposta dos serviços públicos para esse drama, o que levou à demissão do ministro, e sobre a organização social em geral que despreza os seus idosos e os vota à solidão e ao abandono.

Em Portugal não houve essa falência dos Serviços públicos, pelo menos de forma notória, e debate-se então o número de mortos: será que o calor só mata franceses ou também mata portugueses ?

O insólito vem quando o Sr. Ministro chega a uma conclusão espantosa, que a ser verdade, deveria levar sim a uma investigação muito séria e cuidada: Em Portugal o calor não mata as pessoas, só 4 portugueses (que, direi eu, deveriam ter algum sangue francês).

Para pôr a situação em perspectiva vou contar-lhes o que se passou perto de mim.

No passado 8 de Agosto morreu, na sua casa, um familiar meu idoso, com fortes problemas respiratórios. Ao sentir-se tão mal dirigiu-se em ambulância à urgência do hospital de Évora e ao fim de pouco mais de 1 hora foi remetido de novo para casa, pelo hospital, aconselhado a consultar um otorrinolaringologista.

Horas depois, morria em casa, só, no seu leito e em grande desespero.

A autópsia diz: morte por causas desconhecidas.

Histórias destas devem haver aos milhares e explicam tudo o que se passou em Portugal:

1.Morreu tanta gente como nos outros países, naturalmente, somos todos seres humanos.
2.Os serviços não faliram porque estão em falência permanente, não congestionam porque não recebem as pessoas em aflição e as remetem para morrer em casa.
3.Consultando os registos hospitalares o Sr. Ministro pode ficar assim contente, nos hospitais não morreu quase ninguém.

Não tenho qualquer dúvida.

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