2008-04-03

A ética sexual polaca

Na cultura dos povos, mais do que os monumentos, os trajes, as festividades, o folclore, interessam-me os hábitos, os comportamentos e as atitudes sobre diferentes assuntos que tem o cidadão comum.
A atitude face ao sexo é dos aspectos mais interessantes que podemos encontrar numa sociedade, isto porque o sexo é um aspecto central na vida humana e multidimensional.
Tem uma dimensão individual, que traduz o posicionamento de cada indivíduo face ao sexo e dentro deste múltiplos subaspectos, o sexo biológico com que se nasceu, as atracções sexuais, também biológicas que sente, o aspecto quase lúdico que o sexo pode ter, como experiência individual mais ou menos gratificante e os aspectos mais permanentes e emocionais da sua relação com os outros, como o amor e o desamor.
Não falando na dimensão económica que também tem em muitíssimas formas, tem também uma dimensão social. Há ritos e comportamentos próprios de género e esses culturalmente variáveis mas sempre procurando estabelecer a ordem social geral, regras que nem sempre são totalmente coerentes e que são seguidas e quebradas, com tolerâncias também culturalmente variáveis.
Uma última dificuldade para falar deste tema é que precisaríamos, talvez, de ser anjos assexuados para falar, com independência, do assunto, mas não, não foram conclusões traçadas por um anjo voando discretamente sobre a sociedade polaca, são apenas pequenas ilações extraídas por um homem, português, com mais de 50 anos que durante 6 meses se relacionou com muitos homens e mulheres polacos, geralmente jovens e num contexto concreto.
Posta esta introdução, longa mas que me pareceu necessária, começaria por falar da mulher polaca:
Há dois tipos fenotípicos de mulher polaca (obviamente de homens também mas perdoem-me que não lhes tenha dado a mesma atenção) ambos lindíssimos, o tipo eslavo de cabelo muito negro e liso e o tipo nórdico, de cabelos de ouro e olhos claros, traduzindo as interacções culturais que a polónia viveu ao longo da sua história.
São geralmente mulheres muito atraentes mas extremamente recatadas e puritanas quando se apresentam em público, o simples beijo na face no contacto entre homem e mulher que na nossa cultura está tão banalizado, mesmo entre quase estranhos e é mesmo transversal aos estratos sociais, diferenciando-se apenas neste domínio pelo seu número, 1 ou 2 beijos, porém na polónia é sempre inaceitável, só tolerável entre grandes amigos conhecidos há muito tempo, curiosamente é lá muito mais aceitável do que entre nós, os beijos na face entre homens, embora menos do que nas culturas árabes.
Foi das situações mais confrangedoras que vivi quando na entrega dos diplomas da acção de formação que eu, entre outros, monitorámos, instigado por um intérprete, decidi dar um beijinho a cada aluna quando, para lhe dar os parabéns pelo feito de ter terminado a formação, lhes entregava o diploma, como é aliás norma em todos os actos semelhantes em Portugal.
Mas ali não, o nervosismo instalou-se essencialmente entre as jovens que aguardavam a sua vez e a sala encheu-se de risinhos nervosos, até que uma aluna, quando chegou o seu momento me disse afastando a cara: “desculpe mas não posso dar o beijinho porque estou muito constipada”.
Nunca mais tentei essa aventura mas aprendi.
Todavia nas conversas que tinha com homens todos me referiam que as mulheres polacas eram amantes arrebatadoras e incitavam-me a quebrar o gelo inicial e ir mais alem e, na verdade, nas relações diádicas entre mim e uma mulher ou mesmo entre mim e um pequeno grupo totalmente feminino o seu á-vontade era totalmente outro, podíamos mesmo conversar sem qualquer constrangimento sobre temas de conteúdo fortemente sexual e muitas fizeram-me confidências sobre as suas relações amorosas que fariam corar de vergonha muitas jovens mulheres portuguesas.
Na ética sexual polaca há pois um forte contraste entre o que é um comportamento normal na sociedade no seu conjunto, onde sexo ou qualquer alusão sexual não existe e o comportamento em maior intimidade onde o sexo surge com enorme à-vontade.
Uma pequena história que se passou comigo também ilustra este ponto:
Certo dia, no início da minha estada, quando me levantava, no quarto do hotel, bateram-me à porta.
Entreabri-a, visto que eu estava apenas em cuecas e vi uma jovem lindíssima, do tipo nórdico, que me disse ser a minha intérprete para a jornada e, dizendo isto, entrou no quarto, sem qualquer constrangimento enquanto eu me vestia, falando sobre aspectos relativos à nossa relação profissional entre palestrante e interprete.
Essa mesma intérprete Joanna, ou Asia, diminutivo como por vezes gostava de ser chamada, acompanhou-me muito por toda a polónia, aprendi muito com ela sobre a polónia e a sua idiosincrasia e ficámos amigos até hoje, embora muito distantes porque casou e vive na Suiça. Após a última aula em que estivemos juntos ela quis despedir-se e entrou em dissonância cognitiva, a amizade que já tínhamos justificava um beijo na face mas ali em público em frente de mais 30 jovens, um beijo na face do palestrante era intolerável, que fazer ? Deu-me um beijo na face, muito rápido e fugiu, corada de vergonha, a correr pela porta fora entre os assobios e piadas dos alunos. Eu senti-me orgulhoso de ter sido mais importante para ela do que todo aquele preconceito.
Para terminar esta crónica que já vai muito longa ia só contar como me vinguei de uma outra jovem intérprete, esta muito parva e irritante:
Eu dava as minhas aulas em francês, todas as intérpretes eram de francês/polaco e naturalmente como profissionais dominavam o francês muito melhor do que eu, embora o meu francês fosse mais do que suficiente (como comprovou a empresa francesa que me contratou e que com essa desculpa decidiu que não valia a pena contratar intérpretes de português como estava previsto contratualmente) e de facto nunca isso me deu problemas com nenhum intérprete com a excepção dessa tal que em plena aula corrigia o meu francês e fingia muitas vezes não perceber o que eu dizia por não o ter dito num francês de Molière.
Certo dia, porque vagamente veio a propósito, fi-la traduzir “menstruação” para polaco, ficou vermelha que nem um pimento e gaguejou qualquer coisa em polaco mas desde aí nunca mais gozou comigo.

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