A quem se interesse por analisar a política como desentendimento, esta polémica proporciona-nos um verdadeiro estudo de caso.
A questão essencial parece ser a do reconhecimento social de outros tipos de uniões de afecto, que permitam a cada membro de uma parelha homossexual ser reconhecido como tal, tendo todos os direitos inerentes, direito de visita em caso de doença ou prisão de um do membros, direito de partilha de bens, de herança, enfim de todos os direitos que estão, até agora, salvaguardados para os membros de um casal.
E esta reivindicação é justíssima, ninguém, com sentido de justiça, poderá discordar dela.
Como sempre o problema surge apenas com as palavras e o seu significado.
Daí que se discuta:
Dizem uns que se os direitos perseguidos são idênticos aos dos casais, basta alargar o conceito de casal e de casamento, a pares do mesmo sexo.
Parece simples e dá uma resposta de facto ao problema inicial, acontece porém que isso que fere a sensibilidade de muitos de nós, casamento e casal têm um valor semântico preciso e envolve um par constituído por 2 indivíduos de sexo diferente, quando o sexo é irrelevante falamos de pares e parelhas não de casais e de casamento.
A este propósito conto uma história real: Tenho um amigo que em certo momento se dedicou à criação de perdizes para repovoamento e, para iniciar a actividade, encomendou x casais de perdizes. De início teve algum prejuízo porque o fornecedor não lhe vendeu casais, devidamente compostos de uma perdiz e um perdigão, mas apenas pares do mesmo sexo, o certo é que a produção não arrancou ali, não nasceram os esperados perdigotos.
O caso foi comentado entre os amigos como quase anedótico, hoje porém se o caso fosse à justiça uma atenta defesa do fornecedor pudesse invocar essa alteração semântica da palavra casal e justificar assim o seu erro clamoroso.
Mas quem defende o casamento homossexual rebate este problema semântico aumentando a confusão semântica e referindo que ao que nós chamamos casamento deveríamos apenas chamar matrimónio. Uma consulta ao dicionário aponta todavia matrimónio e casamento como palavras sinónimas, defender o casamento homossexual é exactamente o mesmo do que defender o matrimónio homossexual.
A questão complica-se com a discussão do referendo. Como é mais do que expectável que um referendo chumbaria a questão, o debate sobre o casamento homossexual transfere-se para o debate sobre o referendo, os que são contra apoiam o referendo e os que são a favor combatem o referendo e ninguém discute seriamente se se justifica ou não o refendo.
Eu, por exemplo, que sou favorável ao reconhecimento de um qualquer instituto que legitime a união homossexual embora seja contra o casamento homossexual, pelas razões que referi, sou igualmente contra o referendo mas por razões específicas desta figura constitucional.
Há tempos quando se discutiu o eventual reconhecimento do direito à eutanásia, ouvi uma declaração de uma tetraplégica que defendia a eutanásia comentar assim os debates que se desenvolviam sobre o assunto: “o que é que eles sabem disto? Como vão decidir algo sobre o qual não têm a mínima ideia?”. Estas palavras sábias inspiraram-me a que eu fosse contra o presente referendo também, de facto o que é que eu ou qualquer dos votantes heterossexuais sabe do assunto sobre o que vai decidir?
Não me parece justo referendar o que deverão ser os direitos de um grupo particular.
Por último acho interessante como se invoca o direito constitucional à não descriminação para defender este alargamento semântico da palavra casamento e pergunto a mim mesmo se não se terá de aceitar, pelas mesma razões constitucionais, um cego que queira ser árbitro de futebol?
Afinal de contas a questão parece descabida pois essa profissão já tem muitos ceguinhos ou pelo menos é o que parece às vezes.
2010-01-07
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