2005-11-06

França

Tenho para mim que o caminho que o mundo trilha no início deste século XXI, será tudo menos sustentável.
Não obstante nós, que escrevemos e lemos blogues, podermos viver nalgum conforto, todos os dias nos vão entrando ao jantar pela televisão, alguns “fantasmas anónimos” tentando saltar os muros de Melilha, manifestando-se à frente de uma fábrica que fecha, chorando convulsivamente, tendo nos braços um filho morto por um mundo absurdo.
Esta é apenas uma minoria mediática do imenso exército de “escumalha” que esta civilização segrega.
É certo que tememos já o terrorismo anónimo e artesanal que nos tem apoquentado e, os mais pessimistas, vão já receando que esse terrorismo ultrapasse a sua fase artesanal e entre na era nuclear ou da guerra biológica, acabando definitivamente com a nossa paz relativa.
A insustentabilidade desta civilização parece-me transparente como a água, apenas me espanta que a reacção se tenha limitado a grupos mais ou menos sofisticados, meio inseridos no sistema, como a chamada “Al Caida”.
Certo dia, pude ver na tv uma interessante reportagem sobre jovens delinquentes que vandalizavam os comboios suburbanos de Paris:
Dizia um jovem: “estou desempregado, quase toda a minha família também está, onde moro não há empregos, para vir para o centro da cidade tenho que vir de comboio, como não tenho dinheiro para o bilhete o que quer que eu faça ?”
Apesar da reportagem mostrar as fugas aos revisores, os assaltos a cidadão pacatos para roubar uns cobres, e todo o antipático comportamento desses jovens, não pude deixar de pensar que o rapaz tinha razão.
Tão simples como isto: Onde está a saída ? Que solução tem esta civilização global para estas situações ?
Um dia isto tem de rebentar, pensei.
E rebentou, em França, a revolta dessa “escumalha” que quer deixar de o ser.
Penso que o que se passa agora em França só poderá repetir-se noutros lugares e aumentar de intensidade.
O que será quando toda essa gente ouvir a canção heróica de Lopes Graça e acordar ?

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

José Gomes Ferreira

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