Há dias, num dos debates da TVI24, ouvi a um analista político, cujo nome, infelizmente, não retive, a explicação mais lúcida que alguma vez foi dita ou escrita sobre esta crise das escutas.
Citando Eça sobre a metáfora do manto diáfano da fantasia que cobre a nudez crua da verdade disse: o manto foi rasgado, agora todos podem ver o traseiro do governo.
É bem verdade, não há diferença entre Sócrates e todos os anteriores governos, neste domínio, o uso dos circuitos informais, do dito tráfego de influência, sempre foi uma medida utilizada por todos os governos para defenderem os seus pequenos e grandes interesses, só que tudo isto era feito debaixo do manto diáfano da fantasia que agora se rasgou.
As novas tecnologias de informação, as chamadas NTI, os telemóveis, os FAX, a Internet, tudo isso, é um mundo novíssimo que coloca problemas também novos.
Eu, no meu escasso tempo de vida, testemunhei essa mudança, lembro-me de assistir a acções de divulgação que nos falavam desse mundo novo da Internet mas que exigia ter um computador, caríssimo, que talvez algum dia pudesse vir a comprar e de ter, de serviço, um dos primitivos telemóveis, que exigiam uma enorme caixa na mala do carro mas que me permitiram, algures, no anos 80 do século passado, telefonar de uma zona perdida de França para a família e, imaginem, sem pagar um tostão. O próprio capital ainda não se tinha apropriado do meio, só a investigação funcionava e queria mostrar as suas conquistas.
Lentamente ou melhor rapidissimamente, tudo entrou no nosso quotidiano e tudo mudou.
Depois vimos já Aznar, em Espanha ser “distituído”, por manifestações convocadas por SMS, podemos saber das coisas mais recônditas, em blogs, nos twitter e nos face book. Vemos a China e outros países, apanhados de surpresa, a tentar lutar contra o google e a internet para que o seus cidadãos não espreitem debaixo do manto diáfano.
Meditei também sobre como e se Salazar conseguiria hoje manter o seu lápis azul da censura prévia, bastando para isso, ver este episódio Mário Crespo, que, à antiga, viu recusadad a publicação da sua crónica mas, à moderna, a publicou com mais alarido por outra via digital agora à sua disposição.
É verdadeiramente um mundo novo, os governos ainda não sabem viver nele.
Até que uma nova ordem se estabilize (se é que alguma vez vai estabilizar) nós passaremos sempre a ver o traseiro do governo, a ver o rei nu, como na história.
Sócrates e os outros todos que se aguentem.
2010-02-17
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