2004-11-12

Reflexão sobre a justiça 2

Que a lei tem pouco a ver com a justiça é um facto, para mim, adquirido há muito e se mais razões não houvesse, bastaria verificar que a classificação de um acto como justo ou injusto, não se limita à consideração do acto em si mas a uma infinitude de circunstâncias objectivas, em que ele é praticado, além de condições subjectivas de quem o pratica, motivações, conhecimentos, crenças, atitudes, saúde mental e não sabemos mesmo se o nosso livre arbítrio será tão livre assim ou será antes ouigualmente condicionado por factores inscritos no nosso código genético.
Nenhuma lei pode prever tudo isto, naturalmente, e é por isso que deveriam existir juizes, como homens bons (ou mulheres) e sensatos que mesmo com as suas limitações humanas deveriam analisar os actos concretos, incorporar a informação acessória, deduzir das circunstâncias subjectivas, enfim aproximar um pouco a lei da justiça.
Como exemplo comezinho poderei referir o seguinte:
Existe uma lei, a que felizmente ninguém liga, que me impede de atravessar a rua fora de uma passadeira de peões, se esta existir creio que a menos de 50 metros, todavia se eu visse à minha frente, do outro lado da rua, um cidadão que precisasse da minha ajuda urgente e o trânsito o permitisse, creio que a justiça exigiria e quase ninguém hesitaria um milésimo de segundo entre atravessar imediatamente ou procurar a passagem de peões a 20 ou 30 metros.
A lei tinha sido quebrada mas a justiça tinha sido feita e julgo que qualquer juiz deveria absolver esse alguém sem hesitação, apenas porque sim.
Infelizmente, tendemos, no nosso sistema judicial, para que o juiz não o faça ou que para o fazer tenhamos que recorrer à mentira consentida e estimulada dizendo, por exemplo, que desconhecíamos a existência da passagem de peões ou que pensávamos que estava a mais de 50 metros ou algo no género e felizmente vamos tendo juizes que fingem que acreditam.

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